Parcerias entre o Poder Público e eventos privados: o que diz a legislação sobre o patrocínio de rodeios, feiras e festivais?

A realização de eventos privados com apoio do poder público é prática comum em diversas regiões do Brasil, especialmente em Municípios que buscam fortalecer a cultura local, fomentar o turismo e movimentar a economia.

Contudo, quando se trata da aplicação de recursos públicos em eventos organizados por entes privados, como rodeios, festivais e feiras agropecuárias, é fundamental que sejam observados critérios legais e constitucionais rigorosos.

A seguir, abordamos as condições legais, os cuidados necessários e os instrumentos jurídicos que viabilizam esse tipo de parceria, sempre com o foco na legalidade, transparência e interesse público.

Pode o poder público patrocinar eventos privados?

Sim, desde que respeitados os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência — previstos no caput, do art. 37, da Constituição Federal —, o poder público pode realizar parcerias ou até mesmo patrocinar eventos organizados por entes privados. Isso é possível, por exemplo, quando o evento possui:

  • Relevância pública e interesse coletivo;
  • Potencial de desenvolvimento turístico, cultural ou econômico;
  • Compatibilidade com os objetivos e programas da administração pública.

A ideia central é que a atuação estatal nesses casos não beneficie uma entidade privada de forma indevida, mas sim, atenda a um interesse público legítimo, devidamente justificado em processo administrativo.

Quais os instrumentos jurídicos adequados?

A relação entre o poder público e o organizador privado do evento deve ser formalizada por meio de instrumento jurídico próprio, que dependerá da natureza da parceria. Os mais comuns são:

1. Convênio

Utilizado quando há cooperação mútua, sem finalidade lucrativa, e ambas as partes contribuem com recursos ou serviços.

O poder público pode, por exemplo, ceder espaço, pessoal ou insumos, e a entidade privada executa o evento.

2. Termo de Fomento ou Colaboração

Aplica-se quando a parceria se dá com organizações da sociedade civil (OSC), nos termos da Lei nº 13.019/2014 (Marco Regulatório das OSCs).

O termo de fomento é voltado para iniciativas propostas pela OSC; o de colaboração, para ações propostas pelo poder público. Ambos exigem chamada pública, com exceções previstas em lei.

3. Contrato de Patrocínio

Indicado quando há contrapartida publicitária clara, ou seja, o nome da prefeitura, estado ou entidade pública será exibido como patrocinador. Essa modalidade deve observar o regramento da Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021), especialmente no que diz respeito à contratação direta ou dispensa/inexigibilidade de licitação.

Como formalizar corretamente?

Para garantir a legalidade da aplicação de recursos públicos, o gestor deve seguir alguns passos fundamentais:

1. Justificativa do interesse público

Elaborar parecer técnico demonstrando a relevância do evento para o município ou estado, com indicadores sociais, culturais ou econômicos que justifiquem o apoio público.

2. Previsão legal e orçamentária

O gasto deve estar previsto na Lei Orçamentária Anual (LOA), alinhado ao Plano Plurianual (PPA) e à Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Além disso, é preciso observar a legislação local sobre subvenções, auxílios e contribuições.

3. Processo administrativo formal

A tramitação deve incluir:

  • Requerimento do organizador;
  • Manifestação da área técnica;
  • Aprovação da assessoria jurídica;
  • Autorização da autoridade competente;
  • Assinatura do instrumento jurídico (convênio, termo ou contrato);
  • Prestação de contas posterior (obrigatória).

4. Chamada Pública (se aplicável)

No caso das OSCs, a chamada pública é regra. Em contratos de patrocínio, a chamada também pode ser exigida se houver pluralidade de interessados e ausência de singularidade do objeto.

Exemplos práticos: rodeios, feiras e festivais

Rodeios e festas agropecuárias

São eventos populares em muitas regiões, com potencial de atrair turistas e gerar empregos temporários. O apoio público pode ocorrer via cessão de espaço, estrutura (tendas, banheiros químicos, ambulância), ou aporte financeiro mediante contrapartida social (ex: entrada gratuita em parte do evento).

Festivais culturais e gastronômicos

Quando realizados por entidades privadas com histórico de atuação cultural, esses eventos podem receber recursos via termos de fomento, desde que haja comprovação de impacto cultural e social relevante para a comunidade.

Feiras de agronegócio

Comum em cidades do interior, são oportunidades para promover a agricultura familiar, agroindústrias e capacitação técnica. O apoio público pode ser integralmente justificado com base na política de desenvolvimento econômico e rural.

Riscos e cuidados

Mesmo diante da possibilidade legal, os gestores públicos devem agir com cautela redobrada, para evitar:

  • Acusações de desvio de finalidade ou promoção pessoal;
  • Benefícios indevidos a empresas específicas;
  • Falta de transparência na escolha dos eventos apoiados;
  • Irregularidades na prestação de contas.

A recomendação é que a administração publique anualmente editais de seleção de projetos culturais ou turísticos a serem apoiados, com critérios objetivos e ampla divulgação.

Conclusão

A parceria entre o setor público e o setor privado na realização de eventos é não apenas possível, mas também desejável em muitos contextos — desde que feita com rigor técnico, respeito às normas legais e clara demonstração de interesse público.

O uso correto de instrumentos jurídicos como convênios, termos de fomento ou contratos de patrocínio permite que a administração pública promova cultura, turismo e desenvolvimento local de maneira segura, eficiente e transparente.

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