Emendas parlamentares impositivas: o que são, como funcionam e qual seu impacto no orçamento público

As emendas parlamentares impositivas transformaram o papel do Legislativo no processo orçamentário brasileiro.

Ao garantir que parte das indicações feitas pelos parlamentares se torne obrigatória para a execução do Poder Executivo, esse instrumento passou a representar não apenas uma ferramenta de descentralização de recursos, mas também uma poderosa arma política e institucional.

Neste artigo, vamos entender o que são as emendas impositivas, quais os seus fundamentos jurídicos, como se dá o seu trâmite e quais impactos geram para o orçamento e a gestão pública.

O que são emendas parlamentares?

Emendas parlamentares são propostas apresentadas por deputados e senadores para modificar o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), enviado anualmente pelo Poder Executivo, ao Congresso Nacional.

Por meio dessas emendas, os parlamentares podem redirecionar recursos do orçamento da União para atender demandas específicas de seus estados, municípios ou áreas temáticas.

As emendas podem ser de quatro tipos:

  • Individuais: apresentadas por parlamentares individualmente.
  • De bancada estadual: apresentadas por parlamentares de um mesmo estado.
  • De comissão: propostas por comissões temáticas do Congresso.
  • Coletivas: subscritas por vários parlamentares de forma conjunta.

Até 2015, a execução das emendas era discricionária, ou seja, o governo federal decidia se as cumpriria ou não. A situação mudou com a Emenda Constitucional nº 86/2015.

Fundamentação jurídica: a EC 86/2015 e a EC 100/2019

A Emenda Constitucional nº 86/2015 foi um marco: ela incluiu o §9º, no art. 166, da Constituição Federal, determinando a obrigatoriedade da execução das emendas individuais, dentro do limite de 1,2% da receita corrente líquida (RCL) realizada no exercício anterior.

Desse total, metade deve obrigatoriamente ser destinada a ações e serviços públicos de saúde.

Posteriormente, a Emenda Constitucional nº 100/2019 deu caráter impositivo também às emendas de bancada estadual, estabelecendo que até 1% da RCL pode ser reservado para execução obrigatória dessas indicações coletivas.

Portanto, as emendas impositivas se dividem em dois tipos:

  • Individuais impositivas: previstas no art. 166, §§ 9º a 12, da CF.
  • De bancada impositivas: previstas no art. 166, §§ 13 a 18, da CF, com regulamentação complementar pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

Como funciona o trâmite das emendas impositivas

O processo inicia-se com a apresentação das emendas pelos parlamentares, geralmente até o final do ano legislativo. Após a análise da Comissão Mista de Orçamento (CMO) e a aprovação pelo Congresso Nacional, as emendas aprovadas passam a integrar a Lei Orçamentária Anual (LOA).

No ano seguinte, o Poder Executivo é obrigado a executar as emendas, respeitando o cronograma financeiro e os critérios de execução definidos na LDO. A não execução injustificada pode ser questionada judicialmente, inclusive com possibilidade de responsabilização por crime de responsabilidade.

Contudo, há exceções. A própria Constituição permite que o Executivo deixe de executar a emenda nos seguintes casos:

  • Impedimento de ordem técnica.
  • Impedimento legal.
  • Impedimento de ordem comprovadamente orçamentária ou fiscal.

Nesses casos, é necessário informar e justificar formalmente ao Legislativo, que poderá indicar substituições.

Diferenças e similaridades nas esferas federativas: União, Estados e Municípios

A obrigatoriedade de execução das emendas parlamentares, inicialmente aplicada à União, vem se desdobrando também em discussões e regulamentações nos âmbitos estaduais e municipais.

Embora a Constituição Federal trate diretamente apenas das emendas impositivas no orçamento da União, diversos estados e municípios têm buscado replicar esse modelo em seus próprios regimes orçamentários, com algumas adaptações importantes.

União

No plano federal, as regras estão claramente definidas nas Emendas Constitucionais nº 86/2015 e nº 100/2019, que impõem ao Poder Executivo federal a execução obrigatória de emendas individuais e de bancada. O processo é rigidamente regulado pela Constituição, pela LDO e pela LOA, com fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU) e acompanhamento pelo Congresso.

Estados

Em vários estados brasileiros, foram aprovadas emendas às constituições estaduais ou leis orgânicas que criam modelos semelhantes às emendas impositivas. Em geral, seguem os seguintes parâmetros:

  • Percentual da receita corrente líquida estadual reservado às emendas.
  • Obrigatoriedade de execução de emendas individuais dos deputados estaduais.
  • Regras sobre destinação mínima para saúde, educação ou outras áreas prioritárias.

Apesar disso, nem todos os estados adotam o modelo impositivo, e muitos enfrentam dificuldades para executar as emendas por questões fiscais, o que leva à judicialização e a disputas com os Tribunais de Contas estaduais.

Municípios

Nos municípios, a adoção do modelo de emenda impositiva é mais recente e menos uniforme.

Algumas Câmaras Municipais já aprovaram alterações na Lei Orgânica do Município para obrigar o prefeito a executar emendas dos vereadores, geralmente limitadas a 1% da receita corrente líquida.

No entanto, a realidade fiscal dos municípios pequenos muitas vezes inviabiliza a execução plena, e o debate sobre autonomia do Legislativo versus capacidade financeira do Executivo torna-se ainda mais sensível.

Similaridades e desafios comuns

Independentemente da esfera, os princípios de equilíbrio entre poderes, participação legislativa no orçamento e transparência na execução dos recursos públicos são comuns.

O desafio, porém, reside na viabilidade fiscal e técnica para executar as emendas, especialmente em contextos de queda de arrecadação e rigidez orçamentária.

Além disso, todas as esferas enfrentam o risco de uso político das emendas, especialmente em anos eleitorais, e a necessidade de desenvolver mecanismos de controle e fiscalização robustos para garantir a legitimidade das indicações.

Controle e fiscalização das emendas impositivas

O controle das emendas impositivas é feito pelos Tribunais de Contas (principalmente o TCU), pelo Ministério Público e pela própria sociedade, por meio de ferramentas de transparência ativa.

Cabe também aos parlamentares acompanhar a execução de suas emendas, atuando junto aos ministérios e secretarias responsáveis para viabilizar a efetiva liberação dos recursos.

O uso indevido das emendas — como o direcionamento irregular, superfaturamento ou pactuação com entidades fantasmas — pode configurar improbidade administrativa, corrupção e até enriquecimento ilícito.

Impactos positivos e controvérsias

As emendas impositivas foram pensadas como um mecanismo de democratização orçamentária. Ao permitir que parlamentares influenciem diretamente na destinação de parte dos recursos públicos, elas podem atender demandas locais ignoradas pelo planejamento central do governo federal.

Entre os pontos positivos, destacam-se:

  • Maior equilíbrio entre os poderes.
  • Atendimento direto às necessidades da população.
  • Fortalecimento da atuação parlamentar.

Por outro lado, críticas comuns incluem:

  • Fragmentação do orçamento.
  • Perda de capacidade estratégica do Executivo.
  • Potencial uso político das emendas, como moeda de troca.
  • Risco de pulverização e baixa efetividade dos recursos.

Considerações finais

As emendas parlamentares impositivas representam uma evolução institucional no processo orçamentário brasileiro. Ainda que tragam riscos e desafios, também são ferramentas de participação democrática e de controle político do orçamento.

É fundamental que sua aplicação seja transparente, eficiente e submetida a mecanismos eficazes de controle, para que não se transformem em instrumentos de privilégio, mas em vetores de justiça orçamentária e desenvolvimento regional.

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