É possível acumular o seguro-desemprego com o mandato de vereador? Uma análise jurídica da compatibilidade legal e constitucional - JURISCONSULTAS

É possível acumular o seguro-desemprego com o mandato de vereador? Uma análise jurídica da compatibilidade legal e constitucional

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A questão da compatibilidade entre o recebimento do seguro-desemprego e o exercício de mandato eletivo, especialmente o de vereador, tem gerado dúvidas frequentes no meio jurídico, administrativo e político.

Trata-se de um tema relevante, sobretudo pela ausência de previsão expressa nas normas trabalhistas e constitucionais sobre essa hipótese específica.

Neste artigo, abordaremos o assunto sob os prismas legal, doutrinário, jurisprudencial e de controle externo, oferecendo um panorama completo da discussão e dos cuidados que devem ser tomados por agentes políticos que enfrentem tal situação.

O que é o seguro-desemprego e quem tem direito?

O seguro-desemprego é um benefício de prestação continuada previsto no art. 7º, inciso II, da Constituição Federal de 1988, e regulamentado pela Lei nº 7.998/1990.

Seu objetivo é garantir uma assistência financeira temporária ao trabalhador formal dispensado sem justa causa, auxiliando-o durante a transição no mercado de trabalho.

Conforme dispõe o art. 3º, da referida lei:

Art. 3º Terá direito à percepção do seguro-desemprego o trabalhador dispensado sem justa causa que comprove:

I – ter recebido salários de pessoa jurídica ou pessoa física a ela equiparada, relativos a cada um dos 6 (seis) meses imediatamente anteriores à data da dispensa; 

I – ter recebido salários de pessoa jurídica ou pessoa física a ela equiparada, relativos: (Redação dada pela Medida Provisória nº 665, de 2014)

a) a pelo menos dezoito meses nos últimos vinte e quatro meses imediatamente anteriores à data da dispensa, quando da primeira solicitação; (Incluída pela Medida Provisória nº 665, de 2014) 

b) a pelo menos doze meses nos últimos dezesseis meses imediatamente anteriores à data da dispensa, quando da segunda solicitação; e (Incluída pela Medida Provisória nº 665, de 2014)  

c) a cada um dos seis meses imediatamente anteriores à data da dispensa quando das demais solicitações; (Incluída pela Medida Provisória nº 665, de 2014)

I – ter recebido salários de pessoa jurídica ou de pessoa física a ela equiparada, relativos a: (Redação dada pela Lei nº 13.134, de 2015)

a) pelo menos 12 (doze) meses nos últimos 18 (dezoito) meses imediatamente anteriores à data de dispensa, quando da primeira solicitação; (Incluído pela Lei nº 13.134, de 2015)

b) pelo menos 9 (nove) meses nos últimos 12 (doze) meses imediatamente anteriores à data de dispensa, quando da segunda solicitação; e (Incluído pela Lei nº 13.134, de 2015)

c) cada um dos 6 (seis) meses imediatamente anteriores à data de dispensa, quando das demais solicitações; (Incluído pela Lei nº 13.134, de 2015)

II – Revogado

II – Revogado

III – não estar em gozo de qualquer benefício previdenciário de prestação continuada, previsto no Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, excetuado o auxílio-acidente e o auxílio suplementar previstos na Lei nº 6.367, de 19 de outubro de 1976, bem como o abono de permanência em serviço previsto na Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973;

IV – não estar em gozo do auxílio-desemprego; e

V – não possuir renda própria de qualquer natureza suficiente à sua manutenção e de sua família.

VI – matrícula e frequência, quando aplicável, nos termos do regulamento, em curso de formação inicial e continuada ou de qualificação profissional habilitado pelo Ministério da Educação, nos termos do art. 18 da Lei no 12.513, de 26 de outubro de 2011, ofertado por meio da Bolsa-Formação Trabalhador concedida no âmbito do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), instituído pela Lei no 12.513, de 26 de outubro de 2011, ou de vagas gratuitas na rede de educação profissional e tecnológica. (Incluído pela Lei nº 13.134, de 2015)

§ 1o  A União poderá condicionar o recebimento da assistência financeira do Programa de Seguro-Desemprego à comprovação da matrícula e da frequência do trabalhador segurado em curso de formação inicial e continuada ou qualificação profissional, com carga horária mínima de 160 (cento e sessenta) horas. (Incluído pela Lei nº 12.513, de 2011)

§ 2o  O Poder Executivo regulamentará os critérios e requisitos para a concessão da assistência financeira do Programa de Seguro-Desemprego nos casos previstos no § 1o, considerando a disponibilidade de bolsas-formação no âmbito do Pronatec ou de vagas gratuitas na rede de educação profissional e tecnológica para o cumprimento da condicionalidade pelos respectivos beneficiários. (Incluído pela Lei nº 12.513, de 2011)

§ 3o  A oferta de bolsa para formação dos trabalhadores de que trata este artigo considerará, entre  outros critérios, a capacidade de oferta, a reincidência no recebimento do benefício, o nível de escolaridade e a faixa etária do trabalhador. (Incluído pela Lei nº 12.513, de 2011)

§ 4o  O registro como Microempreendedor Individual – MEI, de que trata o art. 18-A da Lei Complementar no 123, de 14 de dezembro de 2006, não comprovará renda própria suficiente à manutenção da família, exceto se demonstrado na declaração anual simplificada da microempresa individual. (Incluído pela Lei Complementar nº 155, de 2016)

A legislação também estabelece as hipóteses de cancelamento automático do benefício, como a recontratação formal do trabalhador, a comprovação de vínculo ativo ou a fraude na obtenção do seguro.

Portanto, o benefício é incompatível com vínculos empregatícios ativos e com benefícios previdenciários pagos de forma contínua (exceto os expressamente autorizados).

A natureza jurídica do mandato de vereador

O mandato de vereador é exercido por agente político, não configurando vínculo empregatício de natureza celetista ou estatutária.

O agente político é remunerado por meio de subsídio fixado por lei específica, nos termos do art. 29, VI, da Constituição Federal.

A doutrina majoritária reconhece que o agente político, ao exercer função pública eletiva, não se submete às regras celetistas, razão pela qual o exercício de mandato de vereador não gera, por si só, vínculo empregatício, tampouco constitui impedimento para o recebimento de benefícios trabalhistas adquiridos em momento anterior à investidura no cargo.

Autores como Di Pietro e Hely Lopes Meirelles são uníssonos ao tratar da distinção entre servidor público, empregado público e agente político, sendo este último titular de mandato e, portanto, regido por normas constitucionais próprias.

O mandato de vereador impede o recebimento do seguro-desemprego?

A resposta é: não há impedimento legal expresso, desde que atendidos os seguintes requisitos cumulativos:

  • O beneficiário tenha sido dispensado sem justa causa de vínculo anterior;
  • Não possua vínculo empregatício ativo no momento do requerimento do benefício;
  • Não esteja recebendo outro benefício previdenciário de prestação continuada (com exceções legais);
  • O mandato eletivo não tenha sido a causa da dispensa do vínculo anterior.

O subsídio de vereador não equivale a salário sob a ótica trabalhista, nem tem natureza de remuneração previdenciária continuada. Por isso, não há vedação objetiva à percepção do seguro-desemprego.

Importante frisar que o exercício do mandato político também não representa “emprego novo”, para os fins da Lei nº 7.998/1990.

Jurisprudência e fiscalizações: o que dizem os órgãos de controle?

Embora não haja julgados do STF ou STJ especificamente sobre o tema, decisões administrativas e auditorias realizadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) deixam clara a preocupação com pagamentos indevidos do seguro-desemprego a servidores públicos ativos – o que é efetivamente vedado.

Contudo, o TCU não inclui o agente político (vereador) como caso automático de vedação.

Ademais, manuais do Ministério do Trabalho e auditorias da CGU também adotam critério semelhante: o que importa é a existência de vínculo ativo com empresa ou órgão público, e não a condição de vereador por si só.

Cuidados recomendados: transparência e declaração formal

Apesar da ausência de vedação legal direta, recomenda-se cautela administrativa. O agente político que se encontra nesta situação deve:

  • Comunicar formalmente ao Ministério do Trabalho sua condição de vereador (mandato eletivo);
  • Anexar documentação comprobatória da dispensa sem justa causa e do encerramento do contrato anterior;
  • Evitar omissões ou inconsistências nas declarações prestadas no requerimento do benefício.

A boa-fé, a transparência e a cautela com os dados declarados são indispensáveis para prevenir questionamentos futuros, sobretudo diante do cruzamento de dados automatizados entre bancos do governo (RAIS, CNIS, SISCAD, etc.).

Conclusão: mandato de vereador é compatível com seguro-desemprego?

O exercício de mandato eletivo de vereador não constitui causa de exclusão ao direito ao seguro-desemprego, desde que o agente político:

  • tenha sido legalmente dispensado de vínculo celetista anterior;
  • não esteja ocupando outro cargo ou emprego público;
  • e não receba benefício previdenciário continuado.

O subsídio de vereador não descaracteriza a condição de desempregado para os fins da Lei nº 7.998/1990, tampouco representa vínculo celetista. Contudo, é fundamental que a informação seja prestada de forma correta e completa às autoridades competentes, garantindo a legalidade do benefício.

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