A declaração de utilidade pública é uma das formas pelas quais o Poder Público reconhece o valor social de entidades que atuam em benefício da coletividade.
Muito mais do que um selo simbólico, esse reconhecimento pode conferir, à entidade, uma série de benefícios legais e administrativos, como prioridade em convênios com o poder público, isenções fiscais e acesso facilitado a editais e programas de fomento.
Mas o que é preciso para que uma entidade receba esse título? E quem pode concedê-lo?
O que é a declaração de utilidade pública
Trata-se de um ato normativo, normalmente por meio de lei, que reconhece oficialmente o trabalho relevante de uma associação ou fundação civil que presta serviços desinteressados à sociedade.
A entidade, ao receber esse título, passa a ser considerada de “utilidade pública” pela esfera de governo que o concede – seja ela municipal, estadual ou federal.
O título, no entanto, não é automático e exige o cumprimento de critérios legais específicos. Além disso, a análise deve ser feita caso a caso, com base em documentação comprobatória.
Quem pode legislar sobre o tema
De acordo com a Constituição Federal, os Municípios têm competência para legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30, inciso I), o que inclui a possibilidade de reconhecer entidades como de utilidade pública. Isso significa que tanto o Poder Executivo, quanto o Legislativo municipal, podem propor leis que concedam esse título, desde que respeitados os limites legais e constitucionais.
Esse entendimento encontra respaldo também na jurisprudência1:
Ação direta objetivando a inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 2.256/2012 do Município de Itapecerica da Serra. O ato normativo dispõe sobre as condições para as Sociedades, Associações e Fundações serem declaradas de utilidade pública.
II – Lei de iniciativa parlamentar que estabelece iniciativa concorrente da lei para a declaração de utilidade pública. Ausência de reserva legal para iniciativa exclusiva do Poder Executivo.
III – Há previsão na Constituição Estadual paulista no sentido que compete exclusivamente à Assembléia Legislativa a iniciativa das leis que disponham sobre a declaração de utilidade pública de entidades de direito privado (art. 24, § Io, V, da CE). Aplica-se, no caso, o princípio da simetria para a Câmara Legislativa de Itapecerica da Serra,.
IV – A lei em questão não fere o princípio constitucional da separação de Poderes, bem como não gera qualquer aumento direto da despesa ao Município.
V – Ação improcedente, cassada a liminar.
Portanto, não há, via de regra, vedação à iniciativa legislativa parlamentar em projetos que reconheçam entidades de utilidade pública, uma vez que não se trata de matéria de iniciativa exclusiva do Executivo nem acarreta aumento direto de despesas públicas.
Critérios para obtenção do título
Embora os critérios possam variar conforme a legislação da esfera federativa, há requisitos comuns que geralmente precisam ser observados, por exemplo, que estão aptas a requerer o reconhecimento apenas entidades que:
- Tenham personalidade jurídica formalmente constituída;
- Estejam em efetivo funcionamento;
- Prestem serviços gratuitos e desinteressados à coletividade;
- Possuam cargos diretivos não remunerados;
No caso de legislações estaduais, como a do Estado de Minas Gerais (Lei nº 12.972/1998), também se exige:
- Funcionamento contínuo há mais de um ano;
- Idoneidade dos membros da diretoria;
- Declaração formal de que não há remuneração nos cargos de direção.
Além disso, algumas legislações estaduais prevêem que a comprovação desses requisitos deve ser acompanhada por atestados emitidos por autoridades locais, como juízes, promotores, prefeitos, presidentes de câmaras, delegados, entre outros legitimados.
Documentação e análise individualizada
A mera proposição de um projeto de lei declarando uma entidade como de utilidade pública não dispensa a apresentação da documentação comprobatória.
É necessário, por exemplo, apresentar o estatuto da entidade, certidões de regularidade, relatórios de atividades e declarações que atestem a gratuidade dos serviços e a idoneidade da diretoria.
A ausência desses documentos pode inviabilizar a análise técnica e jurídica da proposição. Recomenda-se, portanto, que o projeto de lei esteja sempre acompanhado de dossiê documental que ateste o cumprimento de todos os requisitos legais exigidos.
Atribuição das comissões legislativas
Além da análise técnica e jurídica, a avaliação do mérito da proposta cabe às comissões competentes das casas legislativas, que deverão observar, entre outros aspectos, o histórico de atuação da entidade, o impacto social de suas atividades e a lisura de sua organização.
Esse julgamento de mérito é fundamental para evitar que o título seja concedido a instituições que não possuem efetiva atuação pública, o que poderia comprometer a credibilidade do instituto.
Conclusão
A declaração de utilidade pública representa uma valorização das iniciativas da sociedade civil que, de forma desinteressada, contribuem para o bem-estar coletivo. Para o Poder Público, reconhecer essas entidades é uma forma de ampliar sua rede de apoio social e fortalecer o trabalho em parceria com organizações sérias e comprometidas.
Contudo, esse reconhecimento deve seguir critérios legais objetivos e ser precedido de uma análise criteriosa, que leve em conta a documentação apresentada e a trajetória da entidade. Assim, garante-se que o título cumpra seu verdadeiro propósito: premiar quem realmente serve à coletividade.
- TJ-SP – ADI: 1069744720128260000. SP – 0106974-47.2012.8.26.0000, Relator: Guerrieri Rezende, Data de Julgamento: 17/10/2012, Órgão Especial, Data de Publicação: 25/10/2012. ↩︎